domingo, 25 de dezembro de 2016

Igreja: Papa Francisco vai revolucionando a Igreja politicamente


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Por JESUS RODRIGUES / EL PAÍS
O velho jornalista, diplomata e sacerdote saboreia seu charuto Romeo y Julieta, demora-se no gole do whisky escocês Lagavulin e profere, envolto em uma nuvem de fumaça: “A Igreja é um porta-aviões; não é fácil mudar seu rumo. É formada por 1,3 bilhão de pessoas, 400.000 sacerdotes, 5.000 bispos e 200 cardeais dos cinco continentes. Não é como manobrar com uma canoa. Possui uma inércia incrível. É preciso tempo, firmeza e paciência. E alguém que governe o leme com firmeza. Desde março de 2013 o piloto é Francisco”.
— Como o Papa está mudando a Igreja espanhola?
— O Papa intervém em cada país com a eleição de bispos e cardeais. É sua prerrogativa. E este não se encolhe. Na Espanha, suas mudanças nas principais dioceses e na Conferência Episcopal constituem uma ruptura com o período de Rouco. São bispos confiáveis no aspecto doutrinal. Cinzentos. Discretos. Moderados. Mas abertos ao diálogo. Estão comprometidos com a linha do Papa, é com esses que ele conversa pelo celular, sem passar pela central do Vaticano, onde há muitos ouvidos… a Espanha está sendo um bom laboratório para as mudanças de Francisco.
— O Papa é um revolucionário?
— É um reformador. Por isso admira Lutero. Em sua origem foi um conservador. Mas como confessor conhece bem as debilidades do ser humano. Busca uma evolução mais que uma ruptura. Uma mudança de estilo. Quer uma Igreja pobre para os pobres; que acolha em vez de repreender; com menos burocracia; que construa pontes e não muros; que não acentue somente a moral sexual. É uma mudança clara de prioridades. Francisco sabe que a Igreja só pode sobreviver somando.
Estamos no centro de Roma. A cinco minutos da esplêndida Embaixada da Espanha no Vaticano, um palácio do século XVII com tapeçarias de Rubens, bustos de Bernini e um piso de marchetaria que range como o convés de um veleiro antigo. Em menos de 24 horas, o papa celebrará, na outra margem do Tibre, no coração da basílica de São Pedro, o terceiro consistório de seu pontificado: a reunião de seus cardeais (procedentes de mais de 50 países). E criará, sob o baldaquino de Bernini, sustentando pelas quatro colunas salomônicas, 17 novos príncipes da Igreja entregando-lhes o barrete vermelho e o anel (que não é mais de ouro, mas de prata dourada). Entre eles, Carlos Osoro, arcebispo de Madri, de 71 anos, um de seus homens de confiança.
Ao final desse consistório de novembro, Francisco terá nomeado, em apenas três anos, 44 cardeais eleitores (isto é, com menos de 80 anos e que, portanto, teriam direito de escolher o novo papa em um hipotético conclave) dos 120 que formam esse seleto clube de cardeais. O colégio cardinalício ainda tem 21 eleitores criados por João Paulo II e 56 de Bento XVI. Mas os de Francisco já constituem um terço. Para ser Papa, um cardeal necessita de pelo menos 80 votos de seus pares, o que equivale a dois terços do cardinalato. E a estratégia de Francisco é que sua reforma, a atualização da Igreja, a mudança de seu sistema operacional, não morra com ele. Com as aposentadorias compulsórias dos octogenários, ao ritmo que vão os consistórios e somando os próximos cardeais que nomeará (são significativos os que escolheu não só na Espanha, mas também em países como Bélgica, Estados Unidos, Venezuela e Alemanha, como amostra do perfil dos bispos em que aposta), seu modelo de Igreja pode abarcar, em menos de cinco anos, a maioria do colégio cardinalício.

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