terça-feira, 19 de abril de 2016

Dilma volta a atacar 'golpistas' e diz que 'estão vendendo terreno na lua' para chegar ao poder

Presidente negou que o país tenha 10 milhões de desempregados a jornalistas estrangeiros.
A exemplo do que fez nesta segunda-feira com jornalistas brasileiros, a presidente Dilma Rousseff recebeu correspondentes internacionais no Palácio do Planalto nesta terça-feira e voltou a usar os microfones para criticar, ainda que indiretamente , o vice Michel Temer e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, por manobras 'golpistas'. Dilma atacou a movimentação do PMDB e de outros partidos de oposição por sondagens de nomes para um futuro ministério sob o governo Temer.
- Estão vendendo terreno na Lua - disse antes de voltar a citar conspiração contra seu mandato.
- A conspiração se dá pelo fato que a única forma de chegar ao poder no Brasil é utilizando de métodos, transformando e ocultando o fato que esse processo de impeachment é uma tentativa de eleição indireta, de um grupo que de outra forma não teria acesso pelo único meio justificável, que é o voto direto - concluiu.
Na coletiva de mais de uma hora, a presidente afirmou ainda que o Brasil tem um "veio golpista" e que o processo de impeachment no Congresso Nacional após a redemocratização do país é uma possibilidade "nunca afastada". Foram concedidas seis perguntas aos repórteres, mas nesta terça-feira a presidente falou mais que o dobro do tempo antes de iniciar a entrevista. Dilma dispensou uma longa parte de sua fala detalhando e defendendo por que é inocente.
- O Brasil tem um veio que é adormecido. Um veio golpista adormecido. Se acompanharmos a trajetória dos presidentes no meu país, no regime presidencialista, a partir de Getúlio Vargas, vamos ver que o impeachment, sistematicamente, se tornou um instrumento contra os presidentes eleitos. Eu tenho certeza de que não houve um único presidente depois da redemocratização do país que não tenha tido processos de impedimento no Congresso Nacional. Todos tiveram. Todos - enfatizou, ao citar indiretamente os processos movidos contra os ex-presidentes Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, ambos liderados pelo seu partido, o PT.
E acrescentou:
- O que eu chamo de veio? É essa possibilidade nunca afastada.
A petista, no entanto, não fez menção a pedidos de impeachment que o PT fez quando outros presidentes comandavam o país. Contra Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, foram apresentados 14 pedidos de impeachment, 13 dos quais no seu segundo mandato. Dos 13, 10 foram assinados por deputados federais - um deles, José Genoino, então líder do PT, julgado e condenado como mensaleiro.
Contra Lula foram apresentados 34 pedidos, 33 assinados por cidadãos comuns, e um pelo deputado Alberto Goldman (PSDB-SP). No primeiro mandato de Dilma, 10 pedidos foram protocolados na Câmara dos Deputados, nove assinados por cidadãos comuns, um pelo senador Mário Couto (PSDB-PA). Todos esses pedidos, no total 58, foram arquivados.
Dilma voltou a falar em "engavetador-geral da República" ao se referir à procuradoria-geral no governo Fernando Henrique Cardoso, na qual esteve à frente Geraldo Brindeiro.
'AINDA TEM MUITA COISA QUE NÃO SE SABE'
Ao ser perguntada se ela não sabia da corrupção em seu partido e na Petrobras, ela afirmou que não tinha conhecimento dos malfeitos porque a corrupção é, por natureza, feita "às escuras", e que medidas tomadas pelo seu governo e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva são as causas das investigações atuais.
- Você me pergunta uma coisa interessante. Você me pergunta se eu não sabia. Tão perto e não sabia. Foi preciso a delação premiada, foi preciso o reconhecimento da independência dos procuradores, do Ministério Público, uma atitude em relação à Polícia Federal. Foi preciso um conjunto de leis para que isso fosse descoberto. Agora, o que é próprio da corrupção: ser feito às escuras. Ser escondido. Ela tem que ser investigada - alegou.
A presidente também disse que "ainda tem muita coisa que não se sabe" na política brasileira, referindo-se ainda às práticas de corrupção. Ao mencionar diretamente a Operação Lava-Jato, ela disse não acreditar que as ilegalidades investigadas sejam isoladas, "um raio em céu aberto":
- Não acredito que a Lava-Jato é um raio em céu aberto. Hoje eu não acredito. Antes estava tudo debaixo do tapete. Ainda tem muita coisa que não se sabe. Não vamos acreditar que está tudo escancarado, não é?
SITUAÇÃO ECONÔMICA
Na entrevista, Dilma também declarou que não teve responsabilidade pela crise econômica brasileira, e negou que o país tenha 10 milhões de desempregados. Ela alegou não ser a única responsável pela situação econômica nacional, citando elementos internacionais que contribuíram para a depreciação, e refutou que 10 milhões de brasileiros estejam desempregados.
- Se por conta da crise econômica que afetou o Brasil, que atribuem à minha única responsabilidade, como se eu fosse responsável pelo fim do superciclo de commodities, como se eu fosse responsável pela brutal crise que afetou desde 2009 os países desenvolvidos, como se no resto do mundo essas dificuldades não tivessem sido enfrentadas - argumentou.
De acordo com o dado mais recente da Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (Pnad), em janeiro a população desocupada foi estimada em 9,6 milhões de pessoas, o que representa um crescimento de 42,3% ou mais 2,9 milhões de pessoas a procura de trabalho em relação a um ano atrás. Este número de dispensas é o maior já registrado em um ano na pesquisa do IBGE. Nesta quarta-feira, o instituto divulgará os dados referentes a fevereiro.
A presidente afirmou que os avanços sociais do governo dela e de Lula foram "a maior revolução pacífica do mundo ocidental", e fez um apelo para que não haja "retrocesso":
- A maior revolução pacífica do mundo ocidental ao garantir que quase 36 milhões de pessoas saíssem da miséria e outros tantos conquistassem o estatuto de classe média. Nós não podemos deixar isso retroceder.
Dilma disse também que sofre um processo de "meia verdade", e que, no presidencialismo, é preciso "a verdade inteira" para destituir um presidente:
- Eu estou sendo também objeto, e aí começa a grande injustiça. Ela vai se acumulando em borbotões. Eu estou sendo também vítima de todo um processo de meias verdades. O que eu chamo de processo de meias verdades? A meia verdade é aquela parte da verdade que é mentira. A meia verdade é isso. Ela consiste em tentar induzir, sem dizer as reais implicações daquele ato. No parlamentarismo, é possível: há um voto de desconfiança no gabinete e ele sai. No parlamentarismo. Agora, no presidencialismo, a verdade inteira é que é necessária.
Ao ser questionada sobre a organização das Olimpíadas, que começam em agosto no Rio, Dilma garantiu que o país terá todas as condições de entregar o que foi prometido, e disse que serão os melhores Jogos Olímpicos "do mundo", após dizer que seriam os melhores "do Brasil":
- Será a melhor Olimpíada do Brasil. Do mundo, na verdade - corrigiu-se.
Ela também condenou o voto do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) pelo seu impeachment no último domingo no plenário da Câmara. Bolsonaro fez menção ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, torturador na ditadura militar, que Dilma chamou de "o maior torturador que o país já viu".
Eu de fato fui presa nos anos 1970, de fato eu conheci bem esse senhor ao qual ele se refere. Era e é o maior torturador que esse país já viu. Eu lastimo que esse momento no Brasil tenha dado abertura para a intolerância, para o ódio, para esse tipo de fala. Acho gravíssimo a aventura golpista - afirmou ela, que classificou o episódio como "lastimável".
CENÁRIO DIFÍCIL NO SENADO
Apesar do otimismo com a tramitação do pedido de impeachment no Senado, que a presidente Dilma Rousseff procurou demonstrar segunda-feira, integrantes do governo avaliam como muito difícil a tarefa de impedir a aceitação do processo na comissão especial no Senado. Caso a comissão aceite a ação, isso levará ao afastamento imediato de Dilma do Planalto por até 180 dias.
Se esse diagnóstico se confirmar, o Palácio do Planalto concentrará os seus esforços no julgamento do processo de cassação, que exige ainda mais votos dos senadores. Para o acolhimento, é necessária maioria simples dos senadores presentes em plenário. Já para rejeitar o processo de cassação, basta que Dilma tenha 28 votos dos 81 senadores.

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